segunda-feira, 22 de março de 2010

Criança é ralado...

Era 1991 e eu tinha uns quatro anos. Minha tia Elza, seu marido José e sua filha Juliana moravam na Base Naval da cidade. Aos domingos, os almoços da família toda costumavam ser na casa deles. Lembro que eu adorava ir pois, como o percurso parecia muito longo, o passeio tomava ares de viagem. Além do mais, os primos reunidos e a comida maravilhosa faziam aqueles momentos parecerem ter sido tirados de comerciais de margarina.

Um pouco antes de chegar à casa de meus tios, era possível avistar um pequeno parque repleto de brinquedos coloridos. Todas as vezes que o carro passava em frente, pedia para alguém me levar até ele. Cansada de esperar que alguém cumprisse a promessa e finalmente me levasse lá, elaborei uma estratégia para ir sozinha. Decorei o caminho do parque até a casa de meus tios. Contei o número de ruas, a quantidade de vezes que eu precisaria dobrar para a direita e para a esquerda. Quando todos estivessem distraídos, eu só precisaria fugir e fazer o caminho inverso. O plano era perfeito!

Esperei ansiosamente pelo momento ideal. Eu não lembro, mas devia estar com aquela carinha de criança quando está aprontando, mas ela devia ser tão constante naquele tempo que ninguém percebeu ou deu importância. Até que o instante certo chegou. Era por volta três horas. Todos já haviam almoçado e conversavam animadamente. Saí à francesa. Quando conquistei as ruas, porém, elas não eram bem como eu tinha memorizado. Eram maiores e eu já não sabia mais nem chegar ao parque, nem voltar para casa. Mas não me desesperei.

A esta altura, na casa de meus tios, alguém deu por minha falta. Ninguém havia me visto, então começaram a me procurar. Primeiro, reviraram a casa toda e, claro, não me acharam. Depois, perguntaram aos vizinhos. Nada. Os soldados da guarda também não sabiam informação nenhuma ao meu respeito e foi então que a operação de busca começou. Todos os soldados foram orientados a não deixar nenhuma criança sair dos limites da Base Naval. Cães farejadores foram colocados em meu rastro e helicópteros com lanternas de grande alcance percorriam cada esquina daquele local. (Tá bom, não foi tudo isso, eu confesso...).

Fui encontrada antes do final da tarde, ao lado de umas latas de lixo. É que eu, aos quatro anos de idade, cheguei à conclusão de que alguém - em algum momento daquele dia - iria àquele local jogar o lixo fora e me encontraria. E não é que eu estava certa?! Voltei para casa sã e salva e com uma ótima história para contar na segunda-feira para as minhas coleguinhas de jardim da infância.

Obs.: Foto tirada do site novo-mundo.org

quinta-feira, 11 de março de 2010

De volta ao jardim de minha infância

Abri os olhos e não conseguia acreditar no que via: um lindo jardim através da janela de meu quarto, muito parecido com aquele no qual eu brincava em toda a minha infância.

Levantei-me apressada – era incrível a semelhança! Ao descer da cama, tive a estranha sensação de que ela estava mais alta do que de costume; olhei para baixo e vi nos meus pés minha pantufa cor-de-rosa que não me servia há muitos anos. Corri assustada para o espelho e constatei minha suspeita mais absurda: eu realmente havia voltado a ser criança!

Desci as escadas correndo para ver meus pais. Eles estavam igualmente mais jovens, porém, como se não houvessem percebido o que acontecera, tomavam tranqüilos seu café-da-manhã . Perguntei a eles o que havia acontecido.

– Do que você está falando, princesinha? Tome logo seu café ou chegará atrasada na escola – disse com ternura minha mãe.

Ainda tentei explicar que já estava na faculdade, mas vi que seria inútil. Fui à escola, reencontrei meus amigos, professores.Tudo era tão fascinante! Estava tão feliz que nem me perguntava se era sonho ou realidade.

Ao anoitecer, retirei a pantufa cor-de-rosa e adormeci. Quando acordei, tudo havia voltado ao normal – era um sonho apenas! Mas a lembrança desse sonho fez renascer em mim a criança que um dia fui.


(20/03/2004)

Foto de Elena Kalis (http://www.elenakalisphoto.com/)